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DICA DE LEITURA:ORGULHO E PRECONCEITO - Jane Austen

Bibliotecária Elidária Rocha analisa uma das obras mais famosas da autora da Era Georgiana

10
Jul
2023

 

É uma uma verdade universalmente conhecida que, se você leu Orgulho e Preconceito e achou que ele era apenas mais um “romance chuchu”, é porque você leu errado.

Outra verdade - não universalmente conhecida, tenho certeza, mas também digna de nota - é que Dona Austen apareceria por aqui, mais cedo ou mais tarde, e só poderia ser com sua obra magna.

Jane Austen nasceu em dezembro de 1775, no sul da Inglaterra, onde viveu por 25 anos. Filha de George Austen e Cassandra, a escritora foi a sétima dos oito filhos do casal, sendo seis rapazes e apenas duas moças – Jane e Cassandra.

Fiel representante do espírito inglês e cristã devota, toda a vida e obra de Austen se desenvolvem na Era Georgiana (que precede imediatamente a Vitoriana), e ela, inclusive, dedica o romance Emma ao príncipe regente George IV, que era apreciador da sua obra. Ela começa a escrever ficção ainda no início da adolescência, mas a publicação dos seus livros teve início apenas seis anos antes de sua morte, com o romance Razão e Sentimento, publicado em 1811, que logo alcançou grande sucesso. A autora, entretanto, não assinava suas obras, que eram publicadas sob o pseudônimo “Uma Dama”.

Já o romance Orgulho e Preconceito chegou a ser rejeitado pelos editores quando ainda carregava seu primeiro título, “Primeiras Impressões”. Em 1813, já com o título que conhecemos hoje, o romance se torna mais um sucesso imediato da autora.

Com altas doses de ironia, bom humor e profundidade, o livro apresenta um retrato da sociedade rural inglesa de sua época ao passo que também consegue, há 210 anos, se manter atualíssimo, justamente por colocar diante de nós dois sentimentos – e muitos outros a reboque – que estão sempre em nossa cercania.

Além destes, o romance fala de cortesia, de gentileza, cavalheirismo e caridade, de prudência nas nossas ações e nos nossos julgamentos (favoráveis ou desfavoráveis) – e é muitas vezes por meio do contra exemplo que Austen nos ensina. Ao fim, ele nos fala – ora vejam só! – sobre “primeiras impressões” e sobre como elas podem, mas custam, ser mudadas – exceto no caso do Mr. Collins, que consegue ser monotonamente desagradável da primeira à última aparição no livro.

Bem, é certo que tampouco a declaração de Mr. Darcy deve ser tomada como um tutorial de “como conquistar a sua amada em três passos". Chamá-la de pobre, falar mal da família dela e, por fim, afirmar que gosta dela “contra a sua vontade, contra a sua razão e mesmo contra o seu carácter” certamente se encaixa naquilo do “contra exemplo", sobre o que já falamos.

Aliás, isso me lembra algumas acaloradas e excelentes discussões sobre o Mr. Darcy travadas entre os personagens Prudencia Prim e Hombre del Sillón, no livro El despertar de la Señorita Prim, sobre o perfeito arquétipo de homem que o personagem de Austen representa. No romance de Sanmartín, o segundo, ao escutar a primeira dizer que "qualquer mulher se apercebe sem dificuldade de que o Darcy é um homem que diz exatamente o que é preciso dizer em cada momento.”, retruca:

"– Minha querida Prudencia, não me arme ciladas – replicou […]. –Já lhe disse que não discuto o fato de não existir no mundo um homem como Darcy, o que eu discuto é que a personagem represente um homem perfeito. Como certamente recordará, o romance intitula-se Orgulho e Preconceito porque o senhor Darcy é orgulhoso e a senhorita Elizabeth Bennet tem preconceitos. Ergo, senhorita Prim, Darcy não é perfeito, porque o orgulho é o maior dos defeitos de caráter. Ora, um homem orgulhoso é profundamente imperfeito. 

– Como deve, decerto, saber por experiência própria –respondeu a bibliotecária, antes de tapar a boca com a mão, horrorizada com o que acabara de dizer."

Já Alasdair MacIntyre, em seu livro Depois da Virtude: um Estudo em Teoria Moral, reconhece em Austen a combinação de elementos aristotélicos, homéricos e cristãos. Ele afirma, ainda:
“A perspectiva moral de Jane Austen e a forma narrativa de seus romances coincidem. O formato dos romances é o de comédia irônica. Jane Austen escreve comédia, e não tragédia, pelo mesmo motivo que Dante; ela é cristã e vê o telos da vida humana implícito em sua forma cotidiana. Sua ironia está no modo como faz seus personagens e seus leitores enxergarem e dizerem mais do que pretendiam dizer e ver, assim eles e nós nos corrigimos. As virtudes e os males que só as virtudes superam fornecem a estrutura tanto da vida na qual se pode alcançar o telos e de uma narrativa na qual a história de tal vida pode revelar-se. Novamente, percebe-se que qualquer explicação específica das virtudes pressupõe uma explicação igualmente específica da estrutura narrativa e da unidade da vida humana e vice-versa.”

Após a publicação de Orgulho e Preconceito, são publicados ainda em vida os romances Mansfield Park (1814) e Emma (1815). As obras Northanger Abbey e Persuasion (1818) são obras póstumas da autora, que falece em 18 de julho de 1817, em Winchester.

 

Elidária Rocha

Bibliotecária do Colégio do Bosque Mananciais

Formada em Biblioteconomia e Gestão pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

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